PORQUE FAZER (OU NÃO FAZER) UM TESTAMENTO.
Porque fazer (ou não fazer) um testamento.
O testamento é um ato unilateral, individual e até solitário do testador, por meio do qual ele organiza a sua sucessão hereditária, alterando, dentro dos limites permitidos pelo Código Civil, a forma pela qual a lei determina a distribuição do seu patrimônio por ocasião da sua morte.
Portanto, para saber se determinada pessoa deve, ou não, fazer um testamento, é preciso que ela conheça o que a lei dispõe sobre a distribuição da sua herança e o que ela pode alterar, via testamento, a esse respeito.
O artigo 1788 do Código Civil diz que se a pessoa morrer sem deixar testamento a herança é transmitida aos seus herdeiros legítimos.
Nesse caso os herdeiros legítimos herdam na seguinte ordem (artigo 1829 do Código Civil):
Primeiro: os descendentes em concorrência com o cônjuge, se o regime de bens do casamento não for o da comunhão total (porque nesse caso o cônjuge recebe a metade dos bens por meação) ou o da separação obrigatória (por exemplo, se à época do casamento um dos cônjuges tinha mais de sessenta anos de idade).
Segundo: inexistindo descendentes, herdam os ascendentes em concorrência com o cônjuge (também com as restrições acima).
Terceiro: inexistindo descendentes e ascendentes, herda o cônjuge (nesse caso, qualquer que seja o regime de bens do casamento).
Quarto: inexistindo descendentes, ascendentes e cônjuge sobrevivente, herdam os colaterais até o quarto grau (irmãos e sobrinhos).
O companheiro da pessoa falecida também é herdeiro, mas apenas no que se refere aos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável.
Em outras palavras, existindo união estável e não existindo testamento, se um dos companheiros falecer o outro receberá a meação dos bens adquiridos na constância da união estável, mais uma parte sobre esses mesmos bens, concorrendo com os filhos comuns.
Não havendo filhos comuns, mas apenas do companheiro falecido, o sobrevivente, além da meação, receberá a metade da quota que couber a cada um dos descendentes da pessoa falecida.
Se não houver descendentes, o companheiro sobrevivente receberá a meação e mais um terço do patrimônio adquirido na constância da união estável.
E, finalmente, se o companheiro falecido não deixar herdeiros legítimos, o sobrevivente receberá a totalidade da herança.
Essas são as regras sucessórias que estão no Código Civil, se a pessoa morrer sem deixar testamento.
Há possibilidade de alterar parcialmente as regras da sucessão por meio de um testamento. E o simples fato de se fazer um testamento não acarreta a transferência antecipada de nada para nenhum herdeiro. Somente com a morte do testador é que a herança se transmite aos herdeiros.
Por isso o testador pode alterar o testamento quantas vezes quiser. O último testamento, via de regra, revoga automaticamente os anteriores.
A regra geral do testamento está nos artigos 1845 e 1846, ambos do Código Civil.
O primeiro artigo diz que os descendentes, os ascendentes e o cônjuge são herdeiros necessários. E o segundo artigo diz que a metade da herança pertence obrigatoriamente aos herdeiros necessários.
Isso quer dizer que a chamada “legítima” (a metade da herança que pertence obrigatoriamente aos herdeiros necessários) não pode ser objeto de testamento. O testador só pode dispor livremente da outra metade do seu patrimônio, a chamada “parte disponível”.
A parte disponível, por meio do testamento, pode ser direcionada, de forma desproporcional, a um ou a alguns herdeiros, ou ainda a terceiros que não estão incluídos pelo Código no rol de herdeiros legítimos.
O testamento também pode dispor quais os bens que devem compor a legítima de cada herdeiro, ou até a parte disponível daqueles a quem couberem bens pelo próprio testamento.
Ou seja, respeitado o valor da legítima de cada herdeiro necessário, o testamento pode dispor sobre os bens que devem preencher o valor de cada legítima, eliminando, assim, os indesejáveis condomínios entre herdeiros.
O testamento também pode estabelecer usufruto sobre determinados bens em favor de determinada pessoa ou grupo de pessoas, bem como pode gravar com cláusulas de incomunicabilidade (impede que o cônjuge do herdeiro tenha direitos sobre os bens herdados), impenhorabilidade (impede que os bens gravados respondam por dívidas do herdeiro) e inalienabilidade (impede a venda dos bens gravados) determinados bens ou quinhões hereditários, evitando, assim, que os herdeiros disponham livremente dos bens herdados.
O testamento pode excluir herdeiros não qualificados como “necessários”, como por exemplo, o companheiro e os colaterais, assim como pode incluir quaisquer pessoas para herdar na parte disponível do patrimônio.
Essas são as informações básicas (há vários detalhes aqui não tratados em razão da superficialidade da abordagem do tema) que aquela pessoa que pretenda fazer um testamento precisa saber, para decidir se é caso, ou não, de fazê-lo.
José Eduardo Loureiro Filho.
São Paulo/SP, 29 de fevereiro de 2.016.